sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

No fim, vai dar tudo certo?

Eu sou facilmente irritável. Me irrito quando as pessoas me cutucam, quando falam demais, quando falam alto demais, quando se apegam a discussões intermináveis pelo simples prazer de ouvir a própria voz, quando bagunçam minha estante de livros, quando me mandam fazer dieta (como se eu não soubesse o que precisa ser  feito), quando tentam empurrar seus trabalhos pra cima de mim... Enfim, me irrito fácil.

De toda a lista de "irritáveis", acho que tem uma que está no topo (talvez junto com os cutucões): a supervalorização do otimismo. As pessoas têm verdadeiro horror a problemas. Você começa a contar alguma coisa ruim que tenha acontecido com você e a pessoa logo tasca, muitas vezes cortando a sua narrativa, para não ter que ouvir mais nada: "Não se preocupe, no fim, vai dar tudo certo". E pronto, assim o problema vai para debaixo do tapete e todo mundo pode continuar a viver suas vidas.

Aprendi, ao longo dos anos, a dar uma boa maquiada no meu pessimismo. Já percebi que essa é uma característica sem lugar no mundo de hoje. Não sei explicar de onde ele vem, mas tenho algumas pistas. A primeira delas vem do meu total ateísmo. O fato de acreditar na transcendência é, por si só, um ato de otimismo e provê um consolo metafísico, a crença de que existe um plano maior, cuja totalidade não conseguimos compreender e aquela pequena desgraça que acaba de te acontecer é apenas um ato desse plano maior. Como não conhecemos o todo, interpretamos a parte como tragédia.

A segunda suspeita para explicar meu pessimismo é mais benevolente comigo mesma: eu sou simplesmente mais realista. No mundo real, muita coisa dá errado, existe mais chance de dar errado do que de dar certo e, portanto, o pessimista tem uma probabilidade maior de estar certo do que o otimista.

No entanto, para a maioria das pessoas, o otimismo é uma condição essencial para dar continuidade ao planejamento da vida. Ou seja: por que você financiaria um imóvel em 30 anos se achasse que ia ficar desempregado, que não conseguiria pagar a dívida? Por que faria um planejamento estratégico para a sua empresa se achasse que nenhuma ação teria resultado?

Faz sentido.

A contradição aqui é que meu pessimismo não é paralisante. Tanto que eu investi nos estudos, no trabalho, casei, tive filho, financiei um imóvel em 30 anos. O fato de achar que é muito difícil fazer as coisas darem certo não me impede de nada. Muito pelo contrário.

Beleza, esse foi um preâmbulo enorme para contextualizar o que vou dizer agora. Foi com esse estado de espírito que me mudei para a cracolândia. Vendo o que acontece aqui, é muito, mas muito difícil acreditar que a situação tenha solução. Na verdade, até tem. Mas seria preciso ter uma classe política completamente diferente da que temos. E isso, sim, eu acho muito difícil mudar.

Por outro lado, eu quero muito que as coisas melhorem por aqui. Não só porque, morando aqui, sou uma óbvia parte interessada, mas porque a região é muito legal e tem muitas qualidades. Mas o lixo, os noias e a degradação de forma geral se sobrepõem a tudo. Então sempre que vejo alguma coisa melhorando na região, a otimista que habita em alguma região profunda da minha alma vem à tona.

E isso aconteceu hoje. A capa do Divirta-se, o caderno semanal de entretenimento do Estadão, trata de um movimento chamado Baixo Centro, que congrega os diversos movimentos culturais da região e quer fazer um festival no centro em março. São mais de 20 movimentos, fazendo tanta coisa legal. E eu com a minha big fat ass sentada aqui.

Fiquei com muita vontade de participar. Fui lá e doei meu suado dinheirinho para tentar ajudar o festival a acontecer. Mas agora vou tentar dar aquele próximo passo e trabalhar um pouco pros caras. Será que eles precisam de uma jornalista especializada em investimentos? E mais: será que, no final, tudo vai dar certo?

A matéria do Divirta-se tá aqui e o blog do Baixo Centro, aqui.