sábado, 29 de outubro de 2011

Relativismo

O começo do meu namoro com aquele que atualmente vem a ser meu marido foi, digamos, um tanto conturbado. Logo depois que nos conhecemos, eu caí e quebrei a mão (e juro que essa foi a coisa mais light que aconteceu naquele final de ano).

Me lembro muito bem de tudo o que aconteceu naquele final de ano, há seis anos. De muita coisa ruim, mas de uma especialmente boa. Eu e ele estávamos almoçando num boteco. Estávamos juntos há pouquinho tempo. Eu já estava com a mão quebrada. E a gente naquele boteco, batendo um PF de, me lembro perfeitamente, R$ 6. Eu fiquei me debatendo com o bife e ele percebeu e, sem falar nada, pegou meu prato e cortou meu bife pra mim.

E foi assim que percebi que realmente gostava dele. A primeira vez que tive essa certeza. Achei o gesto cuidadoso. E me casei por causa de um bife de um PF de R$ 6. Essa é uma lembrança boa, que não apaga nenhuma das memórias ruins que tenho daquele ano.

Logo depois, fomos à casa de um amigo dele. O amigo não estava lá, tinha ido com a mãe e os irmãos para o sítio da família numa cidade próxima. Na casa do amigo, estava só o pai do amigo. Quando chegamos, ele estava passando mal, sem ar. Nós o levamos ao hospital, tiraram uma chapa do pulmão dele e o médico disse que ele tinha tuberculose e deveria ir ao posto médico na segunda. Levamos ele de volta para a casa dele e ele morreu naquela noite, em casa.

Antes desse fato, aquele tinha sido um dia agradável. Mas não sou capaz de me lembrar do que aconteceu exatamente de agradável, porque esse acontecimento horrível ofusca qualquer outra coisa.

A conclusão, possivelmente influenciada pelo meu estado de espírito neste momento, é que eventos negativos têm um poder incrível, poder de fazer descer uma menstruação, de embranquecer cabelos, de fazer engordar, emagrecer, de unir ou separar as pessoas, de matar alguém do coração. Já os positivos, infelizmente, são muito mais efêmeros e passíveis de serem ofuscados por qualquer merda que ocorra num espaço de tempo bem próximo.

O dia hoje foi assim: começou super bem, continuou super bem e acabou uma bela bosta. E sei que na minha memória só a bela bosta vai ficar.