segunda-feira, 20 de junho de 2011

Bem do seu tamanho

Passei o final de semana grudada com a minha filhinha. Tinha deliberadamente me proposto a fazer isso. Andava sentindo que estava passando muito pouco tempo com ela e que essa intimidade não seria criada quando eu bem entendesse, tipo quando ela tivesse 25 anos e eu já tivesse feito todas as outras coisas que eu pudesse julgar importantes: cuidar da carreira, fazer todos os cursos de mkt e de finanças que eu visse pela frente, assistir aos filmes que eu queria e voltar a ter aquela atualização cinematográfica de 5 anos atrás.

Não, se eu queria ter um laço firme, ele teria de ser alimentado sempre, cotidianamente. É bem óbvio, todo mundo sabe disso, mas a tontona aqui precisa pensar nisso de forma estruturada de vez em quando para não deixar a coisa desandar.

Assim, no sábado, carreguei a filhinha para tudo o que eu pude: levei no parquinho de manhã, brinquei na areia, empurrei no balanço, ajudei no escorregador. Lá pelo meio-dia, arrastei a criança para o shopping Higienópolis, almoçamos lá e depois levei-a ao play do shopping, onde ela pôde brincar nos brinquedões mais estruturados do lugar, todos com muito plástico.

Fazia tempo, muito tempo que não ia ao shopping Higienópolis. E, como minha vida mudou bastante desde a última visita, assim como meu olhar sobre o mundo, achei o shopping mais elitista do que nunca. Não que isso fosse um problema. A gente adorou o cheirinho do lugar, esse negócio que chamam agora de experiência olfativa. Também adorou o brigadeiro da Brigaderia, que eu comi felizona junto com um Nespresso de que eu tanto gosto.

Mas, como eu disse, meu olhar mudou bastante. E ali me senti mais pobre do que costumo me sentir. E me lembrei de um livrinho que li quando era criança, "Bem do seu tamanho", da Ana Maria Machado. Me lembro que, quando li o livrinho, criança, todo um mundo de respostas se abriu para mim: por que, quando eu chorava e pedia colo, minha mãe me dizia que eu era muito grande, mas, quando eu pedia para patinar no gelo na pista toscona ao lado da rodoviária, eu era muito pequena?

Toda criança deve passar por isso. Não fosse assim, essa dificuldade de encontrar seu lugar no mundo não teria inspirado a autora.

Aí transportei o conceito para as classes sócio-econômicas. Percebo claramente que, aqui na Cracolândia, as pessoas do meu prédido e as outras poucas que conheço claramente me classificam como "rica". E percebi ali no shopping Higienópolis que não uso as mesmas roupas, não frequento os mesmos lugares e provavelmente não tenho os mesmos valores que a maior parte delas. Também descobri que fazer luzes no cabelo é obrigatório se você passou ou se aproxima perigosamente dos 40. Observei também que as mães frequentadoras do local usam invariavelmente agasalho esportivo. Acho que essa descoberta não tem lá muita importância, mas fica aí registrada, a quem interessar possa.

E fiquei pensando qual seria de fato o "meu tamanho", como a personagem da Ana Maria Machado, que, coincidência ou não (é óbvio que é coincidência), se chama Helena, mesmo lindo nome da minha pimpolha. A resposta é igualmente óbvia: depende se estou fazendo manha ou pedindo para patinar no gelo (quero dizer que até hoje culpo minha mãe por jamais ter patinado no gelo, ou patinado onde quer que fosse). Ou seja (caso alguém ainda não tenha entendido): depende se meu ponto de referência é Higienópolis ou os vizinhos da Cracolândia.

Me lembrei de uma amiga que disse que se sente perfeitamente inserida na sua classe social. E fiquei com uma invejinha dessa sensação de perfeito conforto na sua própria pele. Deve ser bom não ter dúvidas a respeito do seu tamanho.

Por fim, apenas um adendo: depois de um final de semana de intensa dedicação à minha cria, ainda tive que ouvir a dita cuja dizer que queria dormir com o papai, "só com papai", sendo que o papai não se coloca nenhum tipo de questão existencial e tampouco se preocupa se se encaixa bem em coisa alguma. Maledeto.